Em tempos idos, quando iniciei funções numa multinacional alemã, deslocava-me pelo país reparando equipamentos de automação industrial. Uma vez, chamado ao norte para reparar uma arrolhadora de vinhos, tive o privilégio de almoçar com o dono da empresa. Homem inteligente e perspicaz, mas tão apaixonado por rolhas que deambulou toda a refeição pelo tema. Fascinante!

Numa inversão de papéis, 20 anos depois, farto de ouvir falar em cloud-para-aqui, cloud-para-ali, um empresário vai almoçar com este seu amigo techie que lhe atira ininterruptamente com todos os acrónimos sobre a computação em nuvem enquanto devora esparguete com sardinhas. Confuso, o empresário pergunta-se se é hora de trocar de paradigma tecnológico e avançar numa solução em nuvem.

Convivo regularmente com empresários que se colocam a mesma questão. Vale a pena? Quais os custos? Quais os riscos?

Creio que a questão em concreto não é se vale a pena, mas se já vale a pena!

Segundo um recente relatório da OCDE, Portugal é o país da daquela organização que mais tem crescido em relação ao número de acessos de banda larga. Este fator é fundamental para a implementação de soluções de computação em nuvem. Uma das conclusões do WebSummit2016 de Lisboa aponta para a necessidade de Portugal melhorar as suas infraestruturas tecnológicas,caso queira ser um centro internacional de produção de software.

Em concreto, o que é computação cloud (nuvem)?

Provavelmente, e talvez sem se aperceber, já estará a utilizar uma solução cloud. Quando utiliza o Gmail, uma Dropbox ou até o software de gestão escolar on-line do seu filho está usar um software que se encontra alojado numa cloud.

Muitas pessoas e empresas ainda utilizam soluções proprietárias onde toda a infraestrutura está colocada nas suas instalações. Este modelo implica técnicos qualificados, servidores e equipamentos de rede, sistemas de cópias de segurança, energia de salvaguarda, ar condicionado, controle de acessos, etc..

Em cloud pode mover e alienar, parcial ou totalmente, a infraestrutura para um DataCenter –  localizado, quem sabe na Covilhã, em Paris, Sydney ou Seul -, ficando parte da manutenção e da despesa a cargo do operador (provider).

Existem fundamentalmente três modelos de utilização da solução cloud:  SaaS, PaaS, IaaS.

A escolha de um destes modelos, dependerá das suas específicas necessidades e exigências.

Saas (Software as a Service)

Neste modelo, o utilizador final limita-se a utilizar a aplicação (software) no seu equipamento, pagando, nalguns casos, um aluguer do serviço.

Imagine-se um pequeno escritório de advogados que, ao invés de adquirir um servidor para partilha local de ficheiros entre os vários utilizadores, opta por usar uma Dropbox onde todos colocam os seus documentos que, desta forma, ficam disponíveis e acessíveis a todos os utilizadores qualquer que seja a sua localização. 

Um pequeno servidor permanentemente ligado na empresa, só em energia, pode custar cerca de 175€ / ano. O aluguer na cloud de 1TB pode custar 120€ / ano, sendo este o único custo associado.

Paas (Plataform as a Service)

Muitas vezes as empresas necessitam de aplicações específicas da sua atividade – aplicações de facturação, sites de comércio electrónico ou bases de dados com informações de relacionamentos com clientes (CRM), entre outras.

Na solução tradicional é necessário instalar aplicações nas máquinas dos utilizadores e serviços nos servidores aplicacionais.

O modelo PaaS oferece a possibilidade de substituir aquele paradigma por um serviço de hospedagem onde passará a residir a aplicação. Esta implementação vem frequentemente acompanhada de ferramentas de desenvolvimento e de  monitorização, permitindo às empresas produtoras de software focarem-se na aplicação, reduzindo a complexidade da instalação, atualização e distribuição do software.

IaaS (Infrastructure as a Service)

Em alternativa a manter parcialmente ou a totalidade dos servidores da empresa in-house, estes podem ser movidos para as instalações do provider (datacenter). O provider disponibiliza uma virtualização onde é possível replicar os serviços que se encontravam em execução nas instalações da empresa.

Deve ser dada especial atenção à determinação de quais os elementos que devem ser mantidos in-house por questões de segurança ou performance.

O provider fica tipicamente responsável pelo hardware, armazenamento e rede, assim como pelas cópias de segurança e pela privacidade.

Segurança, privacidade e continuidade neste novo mundo cloud

As pessoas e as empresas têm vindo a adoptar este novo paradigma com o propósito de obterem ganhos de produtividade mas, como todas as tecnologias, também esta lança novos desafios não só funcionais como também jurídicos. Se falhar o acesso à rede, ficaremos cegos? Podem os dados de um processo crime ser guardados numa cloud fora do país? Quem protege os nossos dados dos próprios funcionários do datacenter? Todos os providers afiançam que cifram as comunicações assim como todo o armazenamento, no sentido de tornar inútil a apropriação alheia.

O que me tranquiliza é simplesmente o facto de todos estes dados de milhões de utilizadores juntos, numa área de 10 campos de futebol, fazer de todos nós realmente cidadãos anónimos, como uma tina cheia de rolhas!